A secretária de Estado norte-americana, Condoleezza Rice, em sua passagem pelo Brasil afirmou, fazendo menção a Chávez, que os líderes eleitos democraticamente deveriam governar de forma democrática, para, em seguida, formular indagações: Há imprensa livre? A oposição terá oportunidade de se manifestar? O que ocorrerá com os que criticam o governo?

Menos mal que a nova “dama de ferro” reconheça que o presidente Chávez tenha sido eleito, confirmado e referendado sempre em eleições populares, justas e livres. E lembre-se que se manteve no poder apesar do golpe de Estado, arquitetado e comandado pela oposição fascista, com comprovado apoio político e logístico do Departamento de Estado, e da sabotagem petroleira de dezembro/janeiro de 2003, que recebeu forte respaldo de Washington, valendo-se dos mais arteiros métodos.

E quanto a governar democraticamente? Rice, é evidente, faz tabula rasa das grandes conquistas no campo social: 1,4 milhão de venezuelanos adultos foram alfabetizados e já estão na fase 2 da Missão Robinson. Muito em breve, a Venezuela será território livre do analfabetismo; toda a população pobre do país recebe assistência médica pelo sistema Médico de Família, praticada pelos cerca de 20 mil médicos cubanos e, por enquanto, por poucas centenas de médicos venezuelanos, no programa Barrio Adentro; o sistema Mercal, mercados populares, espalhados pelas principais cidades do país, vende cerca de 4 mil toneladas de alimentos frescos diariamente a preços subsidiados; que jovens pobres têm agora acesso ao curso superior preparados pela Missão Ribas; que o salário mínimo, a partir de 1º de maio será de cerca de 180 dólares; que o desemprego diminuiu em 12 meses de 19,1% para 13,4%, só para citar alguns exemplos.

Que importância tem para a senhora Rice todos esses direitos democráticos econômicos, culturais e sociais, se ela considera democráticos governos que vêem grande parte de sua população em grave estado de pobreza, sem assistência médica, com a segurança alimentar altamente comprometida, muitos mergulhados na escuridão do analfabetismo, os jovens pobres sem esperança na vida, omitindo-se em tomar medidas para amenizar a situação? Ressalte-se que é o excedente do preço do petróleo, riqueza de toda a nação, que financia os programas sociais. No Equador de Lúcio Gutiérrez, também país petroleiro, do excedente, 70% era para amortizar a dívida externa, 20% para custear a própria empresa e 10% para investimentos sociais.

Vamos então às preocupações da senhora Rice. Há imprensa livre? Quem quiser pode entrar no sítio do El Universal, El Nacional, Tal Qual, El Mundo e tantos outros para ver o grau de liberdade que a imprensa escrita tem. E se forem a Caracas liguem a televisão e sintonizem a Globovisión, a Venevisión, a RCTV - o mesmo se dá com as rádios - e ouçam os mais desabridos ataques ao governo sem que nada aconteça. Não há um só jornalista ou dono de meio de comunicação preso por manifestar sua opinião. A oposição terá oportunidade de se manifestar? E se manifesta, no parlamento, nas ruas, nas universidades, na mídia, nas campanhas eleitorais e nas urnas.

Ocorre que com o avanço dos programas sociais, o crescimento sustentado da economia, investimento interno e principalmente externo em setores estratégicos, aumento da consciência política das massas, a oposição está minguando. Logo mais, em 2006, haverá eleição presidencial e a oposição novamente poderá medir forças.

O que ocorrerá com os que criticarem o governo? Nada. Os que caluniarem ou insultarem agora poderão ser legalmente processados. E vou para mais uma pergunta que a secretária Rice esqueceu de fazer. O judiciário é independente? Nos Estados Unidos, como no Brasil, os membros da Suprema Corte são nomeados pelo presidente, livremente.

Na Venezuela, pela Constituição bolivariana, quem nomeia os membros da mais alta corte é o parlamento nacional. E mais outra indagação. O Banco Central é autônomo? É, está na Constituição. Seus dirigentes têm mandato por prazo certo e não são nem um pouco simpáticos a Chávez. Foram eles que limitaram ontem os juros bancários, inclusive os do cartão de crédito, em 28% ao ano [a inflação está em torno de 16% a.a.]. Não foi Chávez como maliciosamente informou um âncora de televisão.

Na verdade, não é a democracia que preocupa a senhora Rice. Nem mesmo o petróleo. Os democráticos reis e xeiques do Oriente Médio poderão suprir de petróleo tudo o que Washington vier a precisar, por bem ou por mal. O que alarma os Estados Unidos é que a Venezuela está seguindo, seriamente, um caminho distinto do neoliberalismo dos consensos e do livre comércio.

O que incomoda é que a Venezuela está deixando o “pátio traseiro” da submissão e da dependência, para adotar medidas concretas na defesa de sua soberania e autodeterminação contra eventuais ataques. O que irrita é a amizade, que se estende aos respectivos povos, entre Chávez e Fidel. O que tira o sono é que o governo Chávez firma importantes acordos econômicos com China, Rússia e Irã, por exemplo, para um impetuoso crescimento econômico. O que os põe nervosos é a insistência e disposição de Chávez de avançar resolutamente em direção à integração dos países de nosso continente, com o Brasil em especial. O que os põe quase loucos é que a revolução bolivariana pode se tornar um atraente exemplo para os povos latino-americanos.