Senhor presidente, senhor secretário-geral, colegas delegados, senhoras e senhores: todos os anos nos reunimos para reafirmar a visão da fundação desta instituição. Na maior parte da história que se tem registro, aspirações individuais estiveram sujeitas aos caprichos de tiranos e impérios. Divisões de raça, religião e tribos eram resolvidas pela espada e pelo confronto de exércitos. A ideia de que as nações e os povos poderiam se unir em paz para resolver suas disputas e fazer avançar uma prosperidade comum parecia inimaginável.
Foi preciso a terrível carnificina de duas guerras mundiais para mudar nosso modo de pensar. Os líderes que construíram as Nações Unidas não eram ingênuos; eles não pensavam que esta organização poderia erradicar todas as guerras. Mas depois de milhões de mortos e continentes destroçados, e com o desenvolvimento das armas nucleares que poderiam aniquilar um planeta, eles entenderam que a humanidade não poderia sobreviver no curso que estava seguindo. E, assim, eles nos deram esta instituição, acreditando que ela permitiria que nós resolvêssemos conflitos, fizéssemos cumprir regras de comportamento e construíssemos hábitos de cooperação que ficariam mais fortes com o tempo.
Durante décadas, as Nações Unidas de fato fizeram diferença – desde ajudar a erradicar doenças a educar crianças e intermediar a paz. Mas como toda geração de líderes, enfrentamos novos e profundos desafios, e esta organização continua a ser testada. A pergunta é se possuímos a sabedoria e a coragem, como Estados-nação e membros de uma comunidade internacional, para enfrentar esses desafios de frente; se as Nações Unidas podem enfrentar as provas do nosso tempo.
Em grande parte do meu mandato como presidente, alguns dos nossos desafios mais urgentes giraram em torno de uma economia global cada vez mais integrada e dos nossos esforços para nos recuperar da pior crise econômica do nosso tempo. Agora, cinco anos depois de a economia global ter entrado em colapso e graças a esforços coordenados dos países aqui presentes hoje, empregos estão sendo criados, sistemas financeiros globais foram estabilizados e as pessoas estão mais uma vez sendo tiradas da pobreza. Mas esse progresso é frágil e desigual, e ainda temos trabalho para fazer juntos para garantir que nossos cidadãos possam acessar as oportunidades de que precisam para prosperar no século 21.
Juntos, também trabalhamos para pôr fim a uma década de guerra. Há cinco anos, quase 180 mil americanos estavam servindo em situação de perigo, e a guerra no Iraque era a questão dominante na nossa relação com o resto do mundo. Hoje, todos os nossos soldados deixaram o Iraque. No próximo ano, uma coalizão internacional terminará a guerra no Afeganistão, tendo atingido sua missão de desmantelar o núcleo da Al Qaeda que nos atacou em 11/9.
Para os Estados Unidos, essas novas circunstâncias também significaram sair de um estado perpétuo de guerra. Além de trazer nossos soldados para casa, limitamos o uso de drones (veículos aéreos não tripulados) para que eles tenham como alvo apenas aqueles que representam uma ameaça constante e iminente para os Estados Unidos, onde a captura não é possível e quando há quase certeza de que não haverá vítimas civis. Estamos transferindo detidos para outros países e julgando terroristas em tribunais de justiça, ao mesmo tempo que trabalhamos com diligência para fechar a prisão da Baía de Guantánamo. E, assim como revimos a maneira que destacamos nossas extraordinárias capacidades militares para que seja compatível com nossos ideais, começamos a rever a maneira que coletamos informações de inteligência, de modo que possamos equilibrar de maneira equilibrada as preocupações legítimas de segurança dos nossos cidadãos e aliados com as preocupações de privacidade compartilhadas por todos.
Como resultado desse trabalho e da cooperação com aliados e parceiros, o mundo está mais estável do que estava há cinco anos. Mas mesmo uma passada de olhos nas manchetes de hoje indica que os perigos continuam. No Quênia, vimos terroristas terem como alvo civis em um shopping lotado, e o nosso coração está com as famílias daqueles que foram afetados. No Paquistão, quase cem pessoas foram mortas recentemente por homens-bomba do lado de fora de uma igreja. No Iraque, mortes e carros-bomba continuam a ser parte terrível da vida. E, enquanto isso, a Al Qaeda dividiu-se em redes e milícias regionais, o que lhes tira a capacidade neste ponto de realizar ataques como o 11/9, mas representa sérias ameaças a governos e diplomatas, empresas e civis em todo o globo.
Da mesma forma, as convulsões no Oriente Médio e no Norte da África revelaram profundas divisões nas sociedades, enquanto uma velha ordem está abalada e as pessoas tentam entender o que está por vir. Movimentos pacíficos com muita frequência têm sido respondidos com violência – daqueles que resistem às mudanças e de extremistas que tentam apoderar-se das mudanças. Conflitos sectários ressurgiram. E a potencial disseminação de armas de destruição em massa continua a ser uma sombra na busca da paz.
Em nenhum lugar vimos essas tendências convergirem com mais força do que na Síria. Lá, protestos pacíficos contra um regime autoritário foram respondidos com repressão e massacres. Em face de tal carnificina, muitos recuaram para sua identidade sectária – alauítas e sunitas; cristãos e curdos – e a situação culminou em uma guerra civil.
A comunidade internacional reconheceu os perigos desde o início, mas nossa resposta não correspondeu à dimensão do desafio. A ajuda não consegue acompanhar o sofrimento dos feridos e deslocados. Um processo de paz ainda não surgiu. Os Estados Unidos e outros países trabalharam para apoiar a oposição moderada, mas grupos extremistas ainda estão enraizados para explorar a crise. Os aliados tradicionais de Assad continuaram apoiando-o, citando princípios de soberania para defender seu regime. E, em 21 de agosto, o regime usou armas químicas em um ataque que matou mais de mil pessoas, inclusive centenas de crianças.
A crise da Síria e a desestabilização da região atingem o cerne dos desafios mais amplos que a comunidade internacional precisa enfrentar agora. Como devemos responder aos conflitos no Oriente Médio e no Norte da África – conflitos entre países, mas também conflitos nos países? Como enfrentamos a opção de nos manter insensíveis enquanto crianças são submetidas a gases neurotóxicos ou de nos envolver na guerra civil de um outro país? Qual é o papel da força na resolução de disputas que ameaçam a estabilidade da região e solapam todas as normas básicas de conduta civilizada? Qual é o papel das Nações Unidas e do direito internacional em atender aos clamores por justiça?
Hoje, quero mostrar onde os Estados Unidos da América se colocam nessas questões. Com relação à Síria, acreditamos que, como ponto inicial, a comunidade internacional precisa fazer cumprir a proibição às armas químicas. Quando afirmei minha disposição de ordenar uma ação limitada contra o regime de Assad em resposta ao descarado uso de armas químicas, não o fiz sem motivos. Fiz isso porque acredito que é do interesse de segurança dos Estados Unidos e do interesse do mundo fazer cumprir de maneira significativa uma proibição cujas origens são mais antigas que a própria ONU. A proibição contra o uso de armas químicas, mesmo em guerra, foi acordada por 98% da humanidade. É reforçada pelas memórias dolorosas de soldados sufocando nas trincheiras; de judeus abatidos em câmaras de gás; de iranianos envenenados às dezenas de milhares.
As evidências são decisivas de que o regime de Assad usou tais armas em 21 de agosto. Inspetores da ONU fizeram um relato claro de que foguetes modernos dispararam grandes quantidades de gás sarin contra civis. Esses foguetes foram disparados de um bairro controlado pelo regime e atingiram bairros da oposição. É um insulto à razão humana – e à legitimidade desta instituição – sugerir que qualquer outra parte que não o regime tenha realizado esse ataque.
Sei que logo após o ataque houve quem questionasse a legitimidade de até mesmo uma ação limitada na falta de um mandato claro do Conselho de Segurança. Mas sem um ameaça militar crível, o Conselho de Segurança não havia demonstrado nenhuma inclinação de agir. No entanto, como discuti com o presidente por mais de um ano, mais recentemente em São Petersburgo, minha preferência sempre foi por uma resolução diplomática para essa questão. E, nas últimas semanas, os Estados Unidos, a Rússia e nossos aliados chegaram a um acordo para colocar as armas químicas da Síria sob controle internacional e depois destruí-las.
O governo sírio deu um primeiro passo prestando conta de seus estoques. Agora precisa haver uma resolução forte do Conselho de Segurança para verificar se o regime de Assad está cumprindo seus compromissos e precisa haver consequências se ele deixar de fazê-lo. Se não pudermos concordar nem mesmo sobre esse ponto, então isso mostrará que as Nações Unidas não têm capacidade de fazer cumprir as leis internacionais mais básicas. Por outro lado, se formos bem-sucedidos, isso enviará uma mensagem poderosa de que o uso de armas químicas não tem lugar no século 21 e que esta organização leva a sério o que diz.
Um acordo sobre armas químicas deve impulsionar um esforço diplomático maior de alcançar uma solução política na Síria. Não acredito que a ação militar – da Síria ou de forças externas – possa alcançar uma paz duradoura. Nem acredito que os Estados Unidos ou qualquer outra nação deva determinar quem vai conduzir a Síria; isso é para o povo sírio decidir. No entanto, um líder que massacrou seus cidadãos e matou crianças com ataque de gás não pode ter legitimidade para conduzir um país seriamente fraturado. A ideia de que a Síria pode de alguma maneira voltar a uma situação anterior à guerra é uma fantasia.
É hora de a Rússia e o Irã perceberem que insistir no governo de Assad conduzirá diretamente ao resultado que eles temem: um espaço cada vez mais violento para os extremistas operarem. Por sua vez, aqueles de nós que continuam a apoiar uma oposição moderada precisam persuadi-los de que o povo sírio não pode bancar um colapso das instituições do Estado e que uma solução política não pode ser alcançada sem enfrentar as preocupações e os receios legítimos de alauítas e outras minorias.
Estamos comprometidos a trabalhar esse caminho político. E, ao perseguirmos uma solução, vamos lembrar que esta não é uma empreitada de soma zero. Não estamos mais na Guerra Fria. Não há um grande jogo para ser ganho, nem os Estados Unidos têm algum interesse na Síria além do bem-estar de seu povo, da estabilidade de seus vizinhos, da eliminação das armas químicas e de garantir que ela não se torne um porto seguro para terroristas.
Saúdo a influência de todas as nações que possam contribuir na obtenção de uma resolução pacífica para guerra civil na Síria. E, ao avançarmos o processo de Genebra, conclamo todas as nações aqui a se comprometer a cumprir as necessidades humanitárias na Síria e nos países ao seu redor. Os Estados Unidos comprometeram-se com mais de US$ 1 bilhão para esse esforço, e hoje posso anunciar que forneceremos mais US$ 340 milhões. Nenhuma ajuda pode substituir uma resolução política que dê ao povo sírio a oportunidade de reconstruir seu país, mas pode ajudar pessoas desesperadas a sobreviver.
Que conclusões mais amplas podem ser aferidas das políticas dos Estados Unidos com relação à Síria? Eu compreendo que existem aqueles que têm se frustrado devido à nossa indisposição em usar nosso poderio militar para depor Assad, e que acreditam que deixar de fazê-lo indica um enfraquecimento do envolvimento americano na região. Outros sugeriram que minha disposição em ordenar até mesmo ataques militares limitados para deter o uso futuro de armas químicas demonstra que não aprendemos nada do Iraque, e que os Estados Unidos continuam a buscar controle sobre o Oriente Médio para nosso próprio benefício. Dessa forma, a situação na Síria reflete uma contradição que persiste na região há décadas: os Estados Unidos são punidos por interferirem na região, acusados de se envolver em todas as formas de conspiração; e, ao mesmo tempo, os Estados Unidos são acusados de deixar de fazer o suficiente para resolver os problemas da região e por mostrar indiferença com relação à população muçulmana que sofre.
Entendo que parte disso é inevitável, em virtude do papel dos Estados Unidos no mundo. Mas essas atitudes contraditórias possuem um impacto prático no apoio do povo americano a nosso envolvimento na região, e permitem que os líderes da região – bem como a comunidade internacional, à vezes – evitem enfrentar problemas difíceis.
Portanto, deixe-me usar esta oportunidade para delinear qual tem sido a política dos EUA com relação ao Oriente Médio e ao Norte da África, e qual será minha política durante o restante de meu governo.
Os Estados Unidos da América estão preparados para usar todos os elementos de nosso poder, inclusive a força militar, para garantir nossos interesses fundamentais na região.
Iremos confrontar agressões externas contra nossos aliados e parceiros, como fizemos na Guerra do Golfo.
Iremos assegurar o fluxo livre de energia daquela região para o mundo. Embora os Estados Unidos estejam reduzindo de maneira estável nossa própria dependência com relação ao petróleo importado, o mundo ainda depende do suprimento de energia da região, e uma interrupção drástica poderia desestabilizar a economia mundial por inteiro.
Iremos desmantelar as redes terroristas que ameaçam o nosso povo. Onde quer que seja possível, iremos reforçar a capacidade de nossos parceiros, respeitar a soberania das nações, e trabalhar para fazer frente às causas profundas do terrorismo. Porém, quando for necessário defender os Estados Unidos contra ataque terroristas, tomaremos ações diretas.
E finalmente, não iremos tolerar o desenvolvimento ou o uso de armas de destruição em massa. Da mesma forma que consideramos o uso de armas químicas na Síria uma ameaça à nossa própria segurança nacional, rejeitamos o desenvolvimento de armas nucleares que possam desencadear uma corrida de armas nucleares na região, e enfraquecer o regime de não proliferação global.
Pois bem, afirmar que esses são os interesses fundamentais dos Estados Unidos não significa dizer que são nossos únicos interesses. Acreditamos profundamente que é de nosso interesse ver um Oriente Médio e um Norte da África pacíficos e prósperos, e continuaremos a promover a democracia e os direitos humanos e os mercados abertos porque acreditamos que essas práticas nos conduzem à paz e à prosperidade. Mas também creio que raramente podemos alcançar esses objetivos por meio de ações unilaterais americanas, especificamente no que diz respeito à ação militar. O Iraque nos ensinou que a democracia não pode simplesmente ser imposta pela força. Ao contrário, esses objetivos são alcançados da melhor maneira quando firmamos parceria com a comunidade internacional e com os países e os povos da região.
Portanto, o que é que isso significa, avançar? No médio prazo, os esforços diplomáticos dos Estados Unidos enfatizarão duas questões específicas: a busca de armas nucleares pelo Irã e o conflito entre árabes e israelenses. Apesar de que essas questões não são a causa de todos os problemas da região, elas têm sido uma fonte essencial de instabilidade há muito tempo, e resolvê-las poderá servir como base para uma paz mais ampla.
Os Estados Unidos e o Irã encontram-se isolados entre si desde a Revolução Islâmica de 1979. Essa desconfiança possui raízes profundas. Os iranianos há tempos reclamam da interferência dos EUA em seus assuntos e do papel dos Estados Unidos em derrubar o governo iraniano durante a Guerra Fria. Por outro lado, os americanos veem um governo iraniano que declarou os Estados Unidos inimigo e diretamente – ou através de meios alternativos – fez americanos reféns, matou soldados e civis americanos, e ameaçou destruir nosso aliado Israel.
Não acredito que esse histórico difícil possa ser superado de um dia para o outro – as suspeitas têm raízes muito profundas. Mas certamente acredito que se nós pudermos resolver a questão do programa nuclear do Irã, isso pode representar um passo importante rumo a um caminho longo que nos leve a uma relação diferente, que seja baseada em interesses e em respeito mútuos.
Desde que assumi o governo, deixei claro através de cartas ao líder supremo do Irã e mais recentemente ao presidente Rouhani que os Estados Unidos preferem resolver nossas preocupações relativas ao programa nuclear do Irã de maneira pacífica, embora estejamos determinados a impedir o Irã de desenvolver uma arma nuclear. Não estamos em busca de uma mudança de regime e respeitamos o direito do povo iraniano de ter acesso à energia nuclear para fins pacíficos. Pelo contrário, insistimos que o governo iraniano assuma suas responsabilidades previstas no Tratado de Não Proliferação Nuclear e nas resoluções do Conselho de Segurança da ONU.
Ao mesmo tempo, o supremo líder emitiu um “fatwa” (pronunciamento legal) contra o desenvolvimento de armas nucleares, e o presidente Rouhani recentemente reiterou que a República Islâmica jamais desenvolverá uma arma nuclear.
Portanto, essas afirmações feitas por nossos respectivos governos devem oferecer a base para um acordo significativo. Devemos ser capazes de alcançar uma resolução que respeite os direitos do povo iraniano, ao mesmo tempo em que damos ao mundo a certeza de que o programa iraniano é pacífico. Porém, para ser bem-sucedido, as palavras de conciliação têm de ser acompanhadas de ações transparentes e verificáveis. Afinal, são as escolhas do governo iraniano que resultaram em sanções abrangentes que vigoram até hoje. E essa não é somente uma questão entre os Estados Unidos e o Irã. O mundo viu o Irã se furtar de suas responsabilidades no passado e possui um interesse permanente em se certificar de que o Irã cumpra com suas obrigações no futuro.
Mas quero deixar claro que estamos encorajados que o presidente Rouhani recebeu do povo iraniano um mandato para buscar um caminho mais moderado. E considerando o compromisso declarado pelo presidente Rouhani de chegar a um acordo, estou enviando John Kerry para buscar esse esforço com o governo iraniano em cooperação estreita com a União Europeia – o Reino Unido, a França, a Alemanha, a Rússia e a China.
Os obstáculos poderão revelar-se muito grandes, mas acredito plenamente que o caminho da diplomacia precisa ser testado. Uma vez que o status quo irá apenas agravar o isolamento do Irã, e o compromisso verdadeiro do Irã em seguir um caminho diferente será positivo para a região e para o mundo, e ajudará o povo iraniano a alcançar seu extraordinário potencial – no comércio e na cultura; na ciência e na educação.
Também estamos determinados a resolver o conflito que remonta a muito antes que nossas divergências com o Irã, ou seja, o conflito entre palestinos e israelenses. Deixei claro que os Estados Unidos jamais abrirão mão de nosso compromisso com a segurança de Israel, e nem de nosso apoio à sua condição de Estado judeu. No início deste ano, em Jerusalém, fui inspirado por jovens israelenses que se posicionaram em defesa da crença de que a paz era necessária, justa e possível. E acredito que há um crescente reconhecimento dentro de Israel de que a ocupação da Faixa de Gaza está esfacelando a estrutura democrática do Estado judeu. Mas as crianças de Israel têm o direito de viver em um mundo onde as nações que se reuniram nesta instituição reconhecem plenamente seu país, e onde nós, de forma inequívoca, rejeitamos aqueles que lançam foguetes em direção a seus lares ou incitam outros a odiá-los.
Da mesma maneira, os Estados Unidos mantêm o compromisso com a crença de que o povo palestino tem o direito de viver com segurança e com dignidade em seu próprio Estado soberano. Durante a mesma viagem, tive a oportunidade de me reunir, em Ramallah, com jovens palestinos cuja ambição e incrível potencial se igualam à dor que sentem por não possuírem um lugar firme na comunidade de nações. É compreensível que estejam cínicos de que o progresso verdadeiro algum dia será alcançado, e estão frustrados com o fato de suas famílias sofrerem a indignidade diária da ocupação. Mas também reconhecem que o único caminho real para a paz são os dois Estados – uma vez que da mesma maneira que o povo palestino não deve ser desalojado, o Estado de Israel veio para ficar.
Portanto, o momento agora é ideal para que toda a comunidade internacional apoie a busca pela paz. Líderes israelenses e palestinos já demonstraram o desejo de assumir riscos políticos significativos. O presidente Abbas deixou de lado esforços para encurtar a busca da paz e se juntar à mesa de negociações. O primeiro-ministro Netanyahu libertou prisioneiros palestinos e reiterou seu compromisso em relação a um Estado palestino. Diálogos recentes concentram-se em questões relativas ao status final das fronteiras e da segurança, dos refugiados e de Jerusalém.
Portanto, agora, o restante de nós necessita estar disposto a correr riscos também. Os amigos de Israel, incluindo os Estados Unidos, devem reconhecer que a segurança de Israel como Estado judeu e democrático depende da concretização de um Estado palestino, e nós devemos deixar isso claro. Os Estados árabes, e aqueles que apoiaram os palestinos, devem reconhecer que a estabilidade somente será alcançada por intermédio de uma solução que envolva dois Estados e uma Israel segura.
Todos nós devemos reconhecer que a paz será uma ferramenta poderosa para derrotar extremistas espalhados na região, e para encorajar aqueles que estão preparados para construir um futuro melhor. E mais ainda, os laços comerciais entre israelenses e árabes podem representar um mecanismo de crescimento e de oportunidade em um momento em que muitos jovens na região estão sofrendo com o desemprego. Portanto, vamos superar as arestas da culpa e do preconceito. Vamos apoiar os líderes israelenses e palestinos que estão preparados para trilhar essa difícil estrada rumo à paz.
Avanços verdadeiros nessas duas questões – o programa nuclear do Irã e a paz entre israelenses e palestinos – teriam um impacto profundo e positivo em todo o Oriente Médio e no Norte da África. Mas as convulsões atuais que se originaram da Primavera Árabe nos fazem lembrar de que uma paz justa e duradoura não pode ser medida apenas por acordos entre nações. Deve também ser medida por nossa capacidade de solucionar conflitos e promover a justiça dentro das nações. E, com base na mesma medida, está claro que todos nós temos muito trabalho a fazer.
Quando transições pacíficas se iniciaram na Tunísia e no Egito, o mundo inteiro estava cheio de esperança. E embora os Estados Unidos – como outros – foram abalados com a velocidade da transição, e embora nós não – na realidade, não pudemos – ditar os eventos, preferimos apoiar aqueles que clamavam por mudança. E o fizemos com base na crença de que apesar de que essas transições sejam difíceis e exigem tempo, as sociedades baseadas na democracia, na abertura e na dignidade do indivíduo serão, em última análise, mais estáveis, mais prósperas e mais pacíficas.
Durante os últimos anos, especificamente no Egito, temos visto o quão difícil essa transição deverá ser. Mohamed Morsi foi eleito de maneira democrática, mas mostrou-se receoso ou incapaz de governar de maneira que fosse plenamente inclusiva. O governo interino que o substituiu respondeu aos desejos de milhões de egípcios que acreditaram que a revolução havia tomado o rumo errado, mas esse governo também tomou decisões incompatíveis com uma democracia inclusiva – através de uma lei de emergência e restrições à imprensa, à sociedade civil e aos partidos de oposição.
Obviamente os Estados Unidos têm sido atacados por todos os lados desse conflito interno, simultaneamente acusados de apoiar a Irmandade Muçulmana e de orquestrar sua remoção do poder. Na verdade, os Estados Unidos têm evitado propositalmente escolher que lado apoiar. Nosso interesse primordial nesses últimos anos tem sido incentivar um governo que reflita legitimamente a vontade do povo egípcio e reconheça a democracia verdadeira, como exigir respeito pelos direitos das minorias e pelo Estado de Direito, pela liberdade de expressão e de reunião, e por uma sociedade civil forte.
Esse permanece nosso interesse hoje. Pois bem, daqui para frente, os Estados Unidos manterão um relacionamento construtivo com o governo interino que promova os interesses principais como os Acordos de Camp David e o contraterrorismo. Continuaremos a dar apoio a áreas, como educação, que beneficiem diretamente o povo egípcio. Porém não demos prosseguimento à entrega de certos sistemas militares, e nosso apoio dependerá do progresso do Egito na busca de um caminho mais democrático.
E nossa abordagem em relação ao Egito reflete um propósito maior: os Estados Unidos ocasionalmente trabalharão com governos que não satisfaçam, pelo menos no nosso entender, as mais altas expectativas internacionais, mas que trabalhem conosco com base em nossos interesses fundamentais. No entanto, não deixaremos de afirmar princípios consistentes com nossos ideais, quer isso signifique se opor ao uso da violência como um meio de suprimir a discórdia ou apoiar os princípios consagrados na Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Rejeitaremos a noção de que esses princípios são simplesmente exportações oriundas do Ocidente, incompatíveis com o Islã ou com o Mundo Árabe. Acreditamos que sejam direitos inatos de cada pessoa. E enquanto reconhecemos que nossa influência será algumas vezes limitada, apesar de que estaremos atentos quanto aos esforços de impor a democracia fazendo uso da força militar, e apesar de que seremos ocasionalmente acusados de hipocrisia e inconsistência, estaremos engajados na região para uma longa jornada. Pois o trabalho de forjar a liberdade e a democracia é a tarefa de uma geração.
E isso inclui esforços para resolver tensões sectárias que continuam a surgir em lugares como o Iraque, o Bahrain e a Síria. Entendemos que tais questões antigas não podem ser resolvidas por pessoas de fora; elas devem ser abordadas pelas próprias comunidades muçulmanas. Mas já vimos conflitos opressivos chegar ao fim antes – mais recentemente na Irlanda do Norte, onde os Católicos e Protestantes finalmente reconheceram que um ciclo de conflitos sem fim estava fazendo com que ambas comunidades retrocedessem em relação a um mundo em rápida evolução. Então acreditamos que esses mesmos conflitos sectários podem ser superados no Oriente Médio e no Norte da África.
Resumindo, os Estados Unidos têm uma humildade adquirida arduamente quando se trata de nossa habilidade de determinar o curso de eventos em outros países. A noção do império americano pode ser uma propaganda útil, mas não é corroborada pela política americana ou opinião pública atuais. De fato, conforme claramente demonstrado em debates recentes nos Estados Unidos sobre a Síria, o perigo para o mundo é que os Estados Unidos, depois de uma década de guerra – devidamente preocupados com essas questões domésticas, conscientes da hostilidade que nosso engajamento na região tenha gerado em todo o mundo muçulmano – se abstenham, criando um vácuo de liderança que nenhum outro país está pronto para preencher.
Eu acho que tal abstenção seria um erro. Creio que os Estados Unidos devem se manter engajados por nossa própria segurança. Mas também creio que o mundo é melhor por isso. Alguns podem discordar, mas eu acredito que a América é excepcional, em parte porque nós temos demonstrado interesse, por meio do sacrifício de sangue e riquezas, em nos levantar não somente por nossos próprios restritos interesses, mas pelo interesse de todos.
Mas falando honestamente, é muito mais provável investirmos nossa energia nos países que querem trabalhar conosco, que investem em seus cidadãos em vez de em alguns corruptos; que adotam uma visão de sociedade onde todos podem contribuir – homens e mulheres, xiitas ou sunitas, muçulmanos, cristãos ou judeus. Porque da Europa à Ásia, da África às Américas, os países que perseveraram em um caminho democrático emergiram mais prósperos, mais pacíficos e mais investidos em defender nossa segurança comum e nossa humanidade comum. E acredito que o mesmo será verdade para o mundo árabe.
Isso me leva a um ponto final. Haverá momentos em que o colapso das sociedades será tão grande, em que a violência contra civis será tão substancial que a comunidade internacional será convocada para agir. Isso vai requerer novo modo de pensar e algumas escolhas muito difíceis. Embora a ONU tenha sido criada para prevenir guerras entre os Estados, nós cada vez mais enfrentamos o desafio de prevenir a chacina entre Estados. E esses desafios ficarão mais pronunciados ao nos confrontarmos com Estados que estão fragilizados ou fracassando – lugares onde a violência hedionda pode colocar em risco homens, mulheres e crianças, sem nenhuma esperança de proteção por parte de suas instituições nacionais.
Eu deixei claro que mesmo quando os interesses principais dos Estados Unidos não estão diretamente ameaçados, estamos prontos para fazer nossa parte para prevenir atrocidades em massa e proteger os direitos humanos básicos. Mas não podemos e não devemos arcar com o ônus sozinhos. Em Mali, apoiamos tanto a intervenção francesa que fez a Al Qaeda recuar como as forças africanas que estão mantendo a paz. Na África Oriental, estamos trabalhando com parceiros para acabar com o Exército de Resistência do Senhor. E na Líbia, quando o Conselho de Segurança forneceu um mandato para proteger os civis, os Estados Unidos se juntaram a uma coalizão que tomou uma atitude. Graças ao que fizemos lá, inúmeras vidas foram salvas e um tirano não conseguiu voltar ao poder às custas do sangue alheio.
Sei que agora alguns criticam a ação na Líbia como uma lição prática. Eles apontam os problemas que o país enfrenta agora – um governo eleito democraticamente lutando para fornecer segurança; grupos armados, em alguns lugares extremistas, peças dominantes de uma terra fraturada. E esses críticos argumentam que qualquer intervenção para proteger civis está fadada ao fracasso – olhem para a Líbia. Ninguém está mais atento a esses problemas do que eu, pois eles resultaram na morte de quatro eminentes cidadãos americanos que estavam compromissados com o povo líbio, incluindo o embaixador Chris Stevens – um homem cujos esforços corajosos ajudaram a salvar a cidade de Benghazi. Mas alguém realmente acredita que a situação na Líbia seria melhor se Kadafi tivesse a permissão de matar, prender ou brutalizar seu povo até a submissão? É muito mais provável que sem ação internacional, a Líbia estaria agora submersa em guerra civil e derramamento de sangue.
Vivemos em um mundo de escolhas imperfeitas. Diversos países não concordarão com a necessidade de ação em cada situação, e o princípio de soberania está no centro da nossa ordem internacional. Mas a soberania não pode ser um escudo para tiranos cometerem um assassinato gratuito, ou uma desculpa para a comunidade internacional fazer vista grossa. Embora precisemos ser modestos em nossa crença de que podemos resolver todos os males, embora precisemos estar conscientes de que o mundo está cheio de consequências não intencionais, devemos realmente aceitar a noção de que o mundo é impotente em face de uma Ruanda ou Srebrenica? Se esse é o mundo que as pessoas querem para viver, elas devem dizer que sim e contar com a lógica fria dos sepultamentos em massa.
Mas eu acredito que podemos abraçar um futuro diferente. E se não quisermos escolher entre a inação e a guerra, devemos melhorar – todos nós – em políticas que previnam o colapso da ordem básica. Através do respeito pelas responsabilidades das nações e dos direitos dos indivíduos. Através de sanções significativas para aqueles que quebrarem as regras. Através da diplomacia obstinada que resolve as raízes do conflito, não somente suas consequências. Através da assistência em desenvolvimento que leva esperança aos marginalizados. E sim, às vezes – embora não seja suficiente – haverá momentos onde a comunidade internacional precisará reconhecer que o uso multilateral da força militar pode ser necessário para prevenir que o pior aconteça.
Por fim, essa é a comunidade internacional que os Estados Unidos buscam – uma onde os países não cobiçam a terra ou recursos de outros países, mas uma em que carregamos a proposta fundamental dessa instituição e onde todos nós assumimos responsabilidade. Um mundo em que as regras estabelecidas a partir dos horrores da guerra possam nos ajudar a resolver os conflitos de forma pacífica e evitar os tipos de guerras em que nossos antepassados lutaram. Um mundo onde os seres humanos possam viver com dignidade e atender às suas necessidades básicas, quer vivam em Nova York ou em Nairóbi; em Peshawar ou em Damasco.
Essa é uma época extraordinária, com oportunidades extraordinárias. Graças ao progresso humano, um bebê nascido em qualquer parte da Terra hoje pode fazer coisas hoje que há 60 anos teria sido inacessível à massa humana. Eu vi isso na África, onde os países que ultrapassaram o conflito agora estão preparados para avançar. E os Estados Unidos estão com eles, fazendo parceria para alimentar os famintos e cuidar dos doentes, e levar energia a lugares situados fora da rede elétrica.
Eu vejo isso em toda a região do Pacífico, onde centenas de milhares saíram da pobreza em uma única geração. Eu vejo isso nas faces de jovens em toda a parte que podem acessar o mundo inteiro em um só clique, e que estão ávidos por se unirem à causa de erradicar a pobreza extrema e combater as mudanças climáticas, abrir negócios, expandir a liberdade e deixar para trás as antigas batalhas ideológicas do passado. Isso é o que está acontecendo na Ásia e na África. Está acontecendo na Europa e em todas as Américas. É o futuro que o povo do Oriente Médio e do Norte da África merece também – um onde eles possam se concentrar nas oportunidades, em vez de na possibilidade de serem mortos ou reprimidos devido a quem são ou em que acreditam.
Repetidamente, nações e povos mostraram nossa capacidade de mudar – de cumprir os mais altos ideais da humanidade, de escolher nossa melhor história. No mês passado, estive onde há 50 anos Martin Luther King Jr. falou aos Estados Unidos sobre seu sonho, em uma época em que muitas pessoas da minha raça não podiam nem votar para presidente. No início deste ano, estive na pequena cela onde Nelson Mandela aguentou décadas separado de seu próprio povo e do mundo. Quem somos nós para acreditar que os desafios de hoje não podem ser superados, quando vimos que mudanças o espírito humano pode trazer? Quem neste salão pode argumentar que o futuro pertence àqueles que buscam reprimir esse espírito, em vez daqueles que buscam libertá-lo?
Eu sei de que lado da história eu quero que os Estados Unidos da América estejam. Estamos prontos para enfrentar os desafios de amanhã com vocês – firmes na crença de que todos os homens e mulheres são de fato criados iguais, cada indivíduo possui dignidade e direitos inalienáveis que não podem ser negados. É por isso que olhamos para o futuro não com medo, mas com esperança. E é por isso que permanecemos convencidos de que essa comunidade de nações pode garantir um mundo mais pacífico, próspero e justo à próxima geração.
Muito obrigado.
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