Os últimos anos na Venezuela têm sido turbulentos. Nossa democracia tem sobrevivido a um golpe de Estado, uma greve petroleira que devastou a economia e mais recentemente a diversas ações coletivas violentas como a «operação guarimba» [4] ao final de fevereiro. Agora o presidente Chávez tem que enfrentar um novo desafio: as ações que a oposição venezuelana vem desenvolvendo para convocar um referendo revocatório.
Neste caso, estamos diante de um procedimento que é acolhido pelas normas constitucionais, portanto, legítimo, e que está sendo minado por uma campanha midiática e política internacional que busca deslegitimar o processo legal e constitucional em desenvolvimento.
Com a aprovação, em 1999, de uma nova Constituição, a Venezuela se tornou o único país da América Latina no qual seus cidadãos têm o direito, cumprindo com determinados requisitos, de revocar o mandato de qualquer de seus funcionários públicos eleitos, incluindo o presidente. Este novo direito é resultado das aspirações pela ampliação dos espaços de participação que permitira ampliar e aprofundar a democracia.
Depois de um falido golpe de Estado e uma derrotada greve petroleira que procuravam destituir ao presidente Chávez por vías extra-constitucionais, setores majoritários da oposição política vêm concentrando seus esforços para alcançar, a todo custo, a realização de um referendo revocatório presidencial.
Para conquistar esse objetivo, não em poucas ocasiões, esses setores têm se colocado em uma porta que separa o legal do ilegal, além de agradecer ao massivo apoio dos principais meios de comunicação, que ao padronizar a informação têm exitosamente conseguido confundir a opinião pública nacional e internacional. Segundo esta padronização, é o governo que se coloca constantemente fora da lei, criando obstáculos para que os venezuelanos exerçam seu legítimo direito ao referendo revocatório.
Ainda que pese as intensas tensões e conflitos característicos da profunda polarização política que vive a Venezuela atual, até a data do processo revocatório, tudo tem ocorrido dentro das normas vigentes.
No segundo trimestre de 2003, foram indicados os integrantes do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), poder público responsável por conduzir os processos eleitorais no país. Essas indicações foram reconhecidas e bem recebidas, tanto pelas organizações simpatizantes do governo, como pelas da “Coordenadora Democrática”, que agrupa as forças de oposição.
Sendo o referendo um mecanismo de democracia participativa inédito, umas das primeiras tarefas que o CNE teve que cumprir foi a elaboração de um regulamento para pautar os procedimentos que permitissem sua implementação. Este regulamento também foi aprovado por unanimidade, com amplo respaldo das duas partes.
A coleta de assinaturas para solicitar os referendos revocatórios de deputados e do presidente se realizaram em dois finais de semana consecutivos, entre novembro e dezembro de 200, em paz. As assinaturas para referendo presidencial foram entregues com atraso. E o que se supunha que se faria em dias, terminou demorando três semanas, coincidindo com as festividades natalinas. Quando o CNE começou a exercer sua função de árbitro se desencadearam os problemas.
No regulamento aprovado ficou claro que cada solicitante deveria, de próprio punho e letra, completar seus dados. Também estabelecia que em casos excepcionais, nos quais os solicitantes poderiam ser assistidos em suas casas, em tal situação deveria apontar a informação na solicitação.
Isto foi anunciado tanto pelo próprio CNE como pela Sumaté, encarregada pela CD de cuidar das atividades em torno das coletas de assinaturas. No entanto, ao revisar as assinaturas entregues, o CNE se deparou com dezenas de milhares de dados e assinaturas de caligrafia semelhante sem dado algum. Esta situação se apresentou tanto nas assinaturas recolhidas para referendo presidencial como para os referendos dos deputados oficialistas e de oposição.
O CNE poderia ter reconhecido o que dizia o regulamento e eliminar a totalidade de assinaturas e dados de caligrafia similar, recurso pedido pelas organizações que apóiam o governo. O CNE, no entanto, optou por uma solução mais salomônica. As assinaturas foram agrupadas em três categorias: aprovadas, excluídas e em observação. Para estas últimas foi criado um processo de ratificação ou “reparo”. Este processo, depois de muitas pressões e turbulências, terminou sendo aceito pelos principais atores , contando com o respaldo do Centro Carter e da OEA. O processo se encerrará no final deste mês de maio e estará sob controle direto do CNE.
O resultado deste novo processo ainda é incerto. É possivel que termine validando as assinaturas necessárias, algo mais de 2.400 milhões, com as quais o CNE chamará a realização de um referendo revocatório presidencial, que ocorrerá em agosto deste ano. Mas também é possível que o número de solicitantes não seja alcançado. Neste caso, mais de 80% dos venezuelanos inscritos no registro eleitoral estarian manifestando que não têm interesse que o referendo aconteça.
As instituições democráticas requerem para seu bom funcionamento e para a sobrevivência do sistema democrático, que suas decisões sejam acatadas por todos, independentemente de que sejam favoráveis ou não. Em democracia às vezes se ganha, outras se perde. Os venezuelanos esperam que os que não forem favorecidos pela falha do árbitro, o respeite.
[1] Operação guarimba - no final de fevereiro a oposição venezuelana realizou diversos bloqueios com barricadas nas principais vias da cidade de Caracas.
[2] Operação guarimba - no final de fevereiro a oposição venezuelana realizou diversos bloqueios com barricadas nas principais vias da cidade de Caracas.
[3] Operação guarimba - no final de fevereiro a oposição venezuelana realizou diversos bloqueios com barricadas nas principais vias da cidade de Caracas.
[4] Operação guarimba - no final de fevereiro a oposição venezuelana realizou diversos bloqueios com barricadas nas principais vias da cidade de Caracas.
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