O debate sobre a questão agrária está esfriando as relações entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e alguns velhos amigos. Especialmente os cristãos. Um deles é o teólogo Leonardo Boff, ex-frade franciscano, expoente da Teologia da Libertação e companheiro de Lula na Caravana da Cidadania.
Num artigo divulgado dias atrás, Boff disse que o governo do PT, assim como os anteriores, nunca deu a urgência necessária à reforma agrária. Criticou a política econômica, elogiou os movimentos sociais que continuam brigando pela redistribuição de terras e concluiu com uma frase sintomática do processo de desilusão: "A esperança deixou o Planalto e retornou à planície."
O petista histórico Plínio de Arruda Sampaio, que já foi filiado ao antigo PDC, também se mostrou duro. Ao listar os responsáveis pela chacina de cinco sem-terra ocorrida em Felisburgo, Minas, não poupou o Executivo, que não estaria destinando ao Incra verbas suficientes para a reforma. "Não há como absolver o governo Lula de parte da responsabilidade pelas mortes e ferimentos ocorridos", escreveu.
O bispo d. Tomás Balduíno tem sido o crítico mais constante. Presidente da Comissão Pastoral da Terra (CPT), que sempre marchou ao lado do Movimento dos Sem-Terra (MST) e do PT, ele disse ao Estado que a eleição de Lula serviu para mostrar às lideranças populares que nunca devem esperar muita coisa do Planalto.
"Dizem que estou desapontado com o governo e o PT, mas isso não diz tudo: quem está desapontado de verdade são os líderes dos movimentos populares", disse. "Aliás, não se poderia esperar outra coisa de um governo que privilegia o capital financeiro."
Agronegócio
No centro das críticas estão a política econômica do ministro Antonio Palocci e o apoio do governo ao agronegócio. No mesmo artigo, Boff afirmou que os dólares obtidos com a exportação de produtos agrícolas servem para ajudar a pagar a dívida externa, mas com um alto custo social e ambiental: "Pagaremos em dia a dívida e(x)terna a preço de continuar matando e desmatando, não fazendo a reforma agrária e mantendo a exclusão social de milhões."
Neste cenário, também chama a atenção o afastamento de Frei Betto do governo. Amigo de Lula desde os heróicos tempos do sindicato dos metalúrgicos, o dominicano estava encarregado de intermediar o diálogo da Presidência com o MST e as comunidades eclesiais de base (CEBs). Foi um dos articuladores do encontro ocorrido no ano passado durante o qual Lula vestiu o boné do MST.
Frei Betto saiu do governo de forma discreta, alegando problemas pessoais. Coincidência ou não, as relações de Lula com os movimentos só pioraram desde então. Isso não poderia ocorrer nunca, na opinião do dominicano: "Lula é fruto do movimento popular. Sem as CEBs, o MST, a CUT, a Central dos Movimentos Populares e outros movimentos não haveria o Lula presidente".
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