O Equador assistiu, dia 26 de abril, à mais recente negociação do Tratado de Livre Comércio (TLC) entre os Estados Unidos e os três outros países andinos (Bolívia, Peru e Colômbia) apenas como ouvinte, por uma casualidade.

De certa forma, a destituição do ex-presidente Lucio Gutiérrez interrompeu o trabalho da equipe negociadora, mas é certo que o antigo governo deixou a assinatura do acordo adiantada e, até o momento, há poucos sinais para saber qual rumo o novo presidente, Alfredo Palacios, vai dar para as negociações. A mídia corporativa e grandes empresários sustentam o conhecido discurso de que “não há outra alternativa” para o país, senão o TLC.

O discurso, porém, não ameniza os problemas que o Equador tem enfrentado ao longo das negociações. Os Estados Unidos são irredutíveis em temas importantes como agricultura, sobretudo porque não pretendem reduzir os elevados subsídios dados a seus produtores. Como o acordo só vale se for firmado em todos os seus pontos, concentrar o debate em um só tema pode inviabilizar o TLC.

Democracia?

A população, até agora, não teve o direito de opinar sobre o tema. O atual governo levanta a possibilidade de convocar um plebiscito, algo rechaçado por empresários, pois, segundo eles, a discussão poderia se tornar “ideológica”. Certo é que os campesinos e povos originários não podem ser deixados alheios ao processo, mesmo porque sua produção é, em maior parte, voltada para o mercado interno e a enorme variedade de grãos e tubérculos (algo típico dos países andinos) estaria sujeita a interesses externos.

Segundo Jose Encalada, da Confederação Nacional Camponesa, cerca de 200 mil produtores de arroz quebrariam com a firma do tratado. No caso do milho, das 600 mil toneladas consumidas no país, 400 mil provêm do mercado interno. Mas os Estados Unidos querem colocar 400 mil toneladas do seu milho no Equador - toda a produção interna seria afetada. Encalada acrescenta: “Na agricultura o problema não é técnico, mas sim de subsídio. E não há apoio do nosso governo para a agricultura campesina. Os camponeses não conseguem cobrir os seus custos de produção, mas a transnacional sim”. Para o governo estadunidense, além dos interesses econômicos, existe também a urgência de implantar sua política militar na América Latina, sobretudo na fronteira entre Colômbia e Equador.

Patentes

A propriedade intelectual é outro tema atenta à diversidade biológica e à soberania do Equador. Antes do ano de 1993, o país não possuía patente de medicamentos, mas foi pressionado pelos Estados Unidos para que incluísse essa área como tema para a lei de patentes. “Temese que os acordos imponham ao Equador um regime de propriedade intelectual que incremente o preço dos medicamentos para o conjunto da população e impeça que haja suficiente margem política para proteger o direito das pessoas a ter acesso a serviços de saúde”. Com o TLC, indústrias farmacêuticas podem patentear várias matériasprimas, mesmo as que já são conhecidas pelos povos originários.

Na voz de ativistas, o TLC coloca-se acima de instituições nacionais e traz uma política divisionista na região andina. Na Bolívia, por exemplo, o país mais cuidadoso até agora nas negociações - também classificado de “atrasado” pela grande mídia -, o discurso do possível isolamento é moeda corrente. O caso do Equador é sintomático e seus efeitos vão ser sentidos da mesma maneira nos outros países vizinhos. Os movimentos sociais devem conseguir um protagonismo nesse debate, mesmo porque a alimentação nos Andes não é um tema econômico. É cultural.