Depois de quase um século de fracionamento político e ideológico, impactadas ainda pelos reflexos do fim do socialismo real, as mais importantes centrais sindicais internacionais – a CIOLS e a CMT – discutem fundar este ano uma nova internacional sindical.
As companheiras e os companheiros que estiveram em Caracas voltaram entusiasmados com as novas perspectivas das lutas de libertação dos povos latino-americanos e com a retomada dos debates sobre as utopias da esquerda mundial, inclusive sobre o socialismo. Infelizmente, a agenda da campanha pela valorização do Salário Mínimo impediu que eu participasse do VI Fórum Social Mundial deste ano. Felizmente, no entanto, depois de anos de muito ceticismo, parece que vamos voltar a discutir um “socialismo para o século XXI”. É verdade que tudo está para ser redefinido: o papel dos partidos políticos, dos movimentos sociais, do internacionalismo e do nacionalismo entre os povos; o que viria a ser o pós-neoliberalismo e o que é – de fato – o “socialismo” chinês e o império norte-americano.
Mais perto da nossa realidade, de brasileiros, as discussões ocorridas na Venezuela passaram pela conceituação de hemisfério sul, de continente, de interesses dos povos latino-americanos – com o reconhecimento da importância dos movimentos sociais brasileiros e do governo Lula para os povos da região –, do papel do Mercosul e das nacionalidades que o compõem, em especial da anfitriã Venezuela. São todos temas que suscitaram e continuam provocando acirrados debates.
Todo este debate é extremamente oportuno para o internacionalismo sindical. Depois de quase um século de fracionamento político e ideológico, impactadas ainda pelos reflexos do fim do socialismo real, as mais importantes centrais sindicais internacionais – a CIOLS e a CMT - discutem fundar este ano uma nova internacional sindical.
Aqui no nosso País, o sindicalismo também ensaia seus primeiros movimentos neste novo século. Mais de uma década de desconstrução neoliberal, redesenhou o cenário político e o quadro do sindicalismo brasileiro. Enquanto o poder político nacional é polarizado pelo PT e PSDB, no campo sindical a CUT organiza a resistência dos trabalhadores enfrentando ao mesmo tempo as “forças” que querem flexibilizar as relações de trabalho e o radicalismo inconseqüente de quem analisa incorretamente a correlação de forças e crê na possibilidade de conduzir o povo trabalhador com uma varinha mágica.
Para nós da CUT, passaram-se 23 anos de trabalho árduo. Nascemos na luta contra a ditadura, nos fortalecemos lutando ao lado do movimento popular, apoiando a organização dos movimentos de moradia, de direitos humanos, da luta pela reforma agrária. Identificados com o projeto da esquerda brasileira, ajudamos a eleger Lula. Nós tínhamos consciência de que a conquista do governo federal do maior país da América Latina colocava nas mãos da esquerda brasileira uma imensa responsabilidade para a qual era preciso preparar-se. Mudar de fato o Brasil exigia pensar um novo patamar de organização dos trabalhadores, exigia pensar em um novo sindicalismo para o século XXI.
Um sindicalismo para o novo século, no nosso modo de ver, significava nos colocar o desafio de reorganizar a CUT, de reestruturar e fortalecer os ramos e as CUTs estaduais, de avançar na organização dos trabalhadores informais, de praticar a negociação nacional por ramo e ao mesmo tempo produzir uma profunda reforma da estrutura sindical brasileira. Tínhamos consciência das fragilidades herdadas do paternalismo getulista, e sabíamos da importância de uma reforma sindical para permitir o fortalecimento do sindicalismo autêntico na representação dos trabalhadores.
Diante deste desafio, a atual direção nacional da CUT iniciou em 2003 um esforço no sentido de enfrentar uma discussão aprofundada sobre o futuro no movimento sindical brasileiro. O projeto, de iniciativa da Secretaria Nacional de Organização e Secretaria Nacional de Formação, ganhou o nome de “Estratégia e Organização da CUT: construindo o Futuro” e contou com o apoio da Confederazione Italiana Sindicati dei Lavoratori (CISL/Itália), da AFL/CIO norte-americana e da Fundação Friedrich Hebert, da Alemanha. Foram realizadas em 2005 diversos seminários e oficinas, em diferentes regiões do País, resultando num acúmulo significativo de propostas. Este processo todo culminará agora, entre 9 a 11 de março, com um último seminário nacional que concluirá por um conjunto de proposições a serem levadas ao IX Concut, em junho, além do compromisso das entidades em aprofundar a reflexão, no próximo período, visando a elaboração de uma proposição para reestruturação do modelo de organização da Central.
A coincidência deste debate com a renovação do ideário da esquerda latino americana esboçada em Caracas é extremamente alentadora. Nós precisamos aproveitar o espaço do “Construindo o Futuro” para, com ousadia e coragem, repensarmos o sindicalismo cutista para o século XXI. Planejar uma nova CUT independentemente, inclusive, da própria Reforma Sindical, para a qual é preciso convencer outros atores sociais. Reestruturar a CUT a partir do nosso IX Concut tem de ser, mais que uma exigência dos tempos que vivemos, uma reafirmação da nossa independência e autonomia enquanto representação classista.
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