Meus concidadãos americanos, esta noite eu quero falar com vocês sobre a Síria – por que é importante e para onde iremos a partir daqui.
Nos últimos dois anos, o que começou como uma série de protestos pacíficos contra o regime opressor de Bashar al-Assad se transformou em uma guerra civil brutal. Mais de 100 mil pessoas foram mortas. Milhões fugiram do país. Durante esse período, os Estados Unidos trabalharam com aliados para fornecer ajuda humanitária, ajudar a oposição moderada e moldar uma solução política. Mas tenho resistido a apelos por uma ação militar, porque não podemos resolver a guerra civil de outro país através da força, principalmente depois de uma década de guerra no Iraque e no Afeganistão.
Contudo, a situação mudou profundamente em 21 de agosto, quando o governo de Assad matou com gás mais de mil pessoas, inclusive centenas de crianças. As imagens desse massacre são repugnantes: homens, mulheres e crianças enfileirados no chão, mortos por gás venenoso. Outros espumando pela boca, lutando para poder respirar. Um pai agarrado a seus filhos mortos, implorando para que se levantassem e andassem. Naquela noite terrível, o mundo viu em detalhes de arrepiar a natureza terrível das armas químicas e porque a maioria avassaladora da humanidade as declarou proibidas – um crime contra a humanidade e uma violação das leis de guerra.
Nem sempre foi assim. Durante a Primeira Guerra Mundial, os soldados americanos estavam dentre os muitos milhares mortos por gás letal nas trincheiras da Europa. Durante a Segunda Guerra Mundial, os nazistas usaram gás para infligir o horror do Holocausto. Devido ao fato de que essas armas conseguem matar em uma proporção em massa, sem nenhuma distinção entre soldado e criança, o mundo civilizado passou um século agindo para bani-las. E em 1997, o Senado dos Estados Unidos aprovou em maioria esmagadora um acordo internacional proibindo o uso de armas químicas, ao qual 189 países que representam 98 por cento da humanidade agora aderiram.
Em 21 de agosto, essas regras básicas foram violadas, juntamente com nosso senso de humanidade comum. Ninguém contesta que armas químicas foram usadas na Síria. O mundo viu milhares de vídeos, fotos tiradas em telefone celular e relatos de mídias sociais acerca do ataque, e organizações humanitárias reportaram histórias de hospitais lotados de pessoas que tinham sintomas de gás venenoso.
Além do mais, sabemos que o regime de Assad foi responsável. Nos dias que precederam 21 de agosto, sabemos que o pessoal do Assad responsável por armas químicas se preparou para um ataque próximo a uma região onde misturavam o gás sarin. E distribuíram máscaras de gás a suas tropas. Em seguida, de uma região controlada pelo regime, dispararam foguetes em 11 bairros em que o regime estava tentando liquidar as forças de oposição. Logo após os foguetes atingirem os alvos, o gás se espalhou e hospitais ficaram lotados de mortos e feridos. Sabemos que pessoas com os cargos mais altos no exército de Assad revisaram os resultados do ataque e que o regime aumentou o bombardeio dos mesmos bairros nos dias que se seguiram. Também, naquele local, examinamos amostras de sangue e de cabelo das pessoas que testaram positivo para o gás sarin.
Quando ditadores cometem atrocidades, eles dependem que o mundo faça vista grossa até que aquelas imagens terríveis se apaguem da memória. Mas essas coisas aconteceram. Os fatos não podem ser negados. A questão agora é o que os Estados Unidos da América e a comunidade internacional estão preparados para fazer com relação a isso. Pois o que aconteceu com aquelas pessoas – com aquelas crianças – não é somente uma violação da lei internacional; é também uma ameaça à nossa segurança.
Deixe-me explicar o porquê. Se deixarmos de agir, o regime de Assad não verá motivo para parar de usar armas químicas. À medida que a proibição contra essas armas se esvair, outros tiranos não terão motivo para pensar duas vezes antes de adquirir gás venenoso, e de usá-lo. Com o passar do tempo, nossas tropas enfrentariam novamente a perspectiva de guerra química no campo de batalha. E isso facilitaria para que organizações terroristas obtivessem essas armas, usando-as para atacar civis.
Se o combate transbordar para além das fronteiras da Síria, essas armas poderão ameaçar nossos aliados como a Turquia, a Jordânia e Israel. E o fracasso de nos posicionarmos contra o uso de armas químicas enfraqueceria as proibições contra outras armas de destruição em massa, e encorajaria o Irã, aliado de Assad – que tem de decidir se ignora a lei internacional com a construção de armas nucleares, ou se adota um caminho mais pacífico.
Este não é um mundo que devemos aceitar. É isso que está em risco. E é por isso que, após cuidadosa deliberação, determinei que é de interesse de segurança nacional dos Estados Unidos responder ao uso de armas químicas do regime de Assad por meio de um ataque militar direcionado. O propósito desse ataque seria o de impedir que Assad use armas químicas, de destituir seu regime da capacidade de usá-las e de deixar claro ao mundo que nós não vamos tolerar seu uso.
Esse é meu julgamento como comandante em chefe. Mas também sou o presidente da democracia constitucional mais antiga do mundo. Portanto, muito embora eu tenha a autoridade de ordenar ataques militares, eu acredito que foi correto, na ausência de uma ameaça direta ou iminente à nossa segurança, levar este debate ao Congresso. Eu acredito que nossa democracia é mais forte quando o presidente age com o apoio do Congresso. E eu acredito que os Estados Unidos agem de maneira mais eficaz no exterior quando permanecemos juntos.
Isso é especialmente verdade após uma década que colocou mais e mais poder de decisão de guerra nas mãos do presidente, e mais e mais impõe ônus nos ombros de nossas tropas, ao mesmo tempo em que deixa os representantes do povo de lado nas críticas decisões de quando devemos usar a força.
Portanto, eu sei que após o fardo terrível do Iraque e do Afeganistão, a ideia de uma ação militar, não importa quão limitada, não será popular. Afinal, passei quatro anos e meio trabalhando para pôr fim a guerras, e não dar início a elas. Nossas tropas estão fora do Iraque. Nossas tropas estão voltando do Afeganistão. E eu sei que os americanos querem que todos nós em Washington – e especialmente eu – nos concentremos no trabalho de construir nossa nação aqui em casa: colocando as pessoas de volta ao trabalho, educando nossas crianças, expandindo nossa classe média.
Não é de se admirar, portanto, que vocês estejam fazendo perguntas duras. Deixe-me responder algumas das mais importantes perguntas que ouvi de membros do Congresso, e que li nas cartas que vocês enviaram para mim.
Primeiramente, muitos de vocês perguntaram se isso não nos colocará em um terreno escorregadio rumo a outra guerra. Um homem escreveu para mim dizendo que nós “ainda estamos nos recuperando de nosso envolvimento no Iraque”. Um veterano expressou de maneira mais franca: “Esta nação está farta de guerras.”
Minha resposta é simples: eu não vou colocar tropas americanas em solo sírio. Eu não vou buscar uma ação ilimitada como a do Iraque ou a do Afeganistão. Eu não vou buscar uma campanha aérea como a da Líbia ou de Kosovo. Este seria um ataque a alvos específicos com o fim de alcançar um objetivo claro: deter o uso de armas químicas e destituir a capacidade de Assad.
Outros perguntaram se valia a pena partir para a ação se não conseguirmos remover Assad. Como alguns membros do Congresso alegaram, não faz sentido simplesmente atacar dando uma “alfinetada” na Síria.
Vou ser claro: o Exército dos Estados Unidos não dá alfinetadas. Mesmo um ataque limitado enviará uma mensagem a Assad que nenhuma outra nação pode transmitir. Não acredito que devamos remover mais um ditador pela força – aprendemos com o Iraque que fazê-lo nos torna responsáveis por tudo o que vem adiante. Mas um ataque a alvos específicos pode fazer com que Assad, ou qualquer outro ditador, pense duas vezes antes de usar armas químicas.
Outras questões envolvem os perigos de retaliação. Nós não descartamos nenhuma ameaça, mas o regime de Assad não tem a habilidade de seriamente ameaçar nossas Forças Armadas. Qualquer outra retaliação que eles buscarem recorrer corresponde às ameaças que enfrentamos todos os dias. Nem Assad, nem seus aliados têm interesse em escalar o que levaria à sua morte. E nosso aliado, Israel, pode se defender com uma força esmagadora e com o apoio inabalável dos Estados Unidos da América.
Muitos de vocês fizeram uma pergunta mais ampla: por que devemos nos envolver em um lugar que é tão complicado, e onde – como uma pessoa me escreveu – “aqueles que perseguem Assad são inimigos dos direitos humanos?”
É verdade que alguns dos opositores de Assad são extremistas. Mas Al Qaeda somente recorrerá à força em uma Síria mais caótica se as pessoas lá virem que o mundo não está fazendo nada para evitar que civis inocentes sejam levados à morte asfixiados por gases. A maioria do povo sírio – e a oposição síria com quem trabalhamos – quer apenas viver em paz, com dignidade e liberdade. E no dia depois de qualquer ação militar, redobraremos nossos esforços para alcançar uma solução política que fortaleça aqueles que rejeitam as forças da tirania e do extremismo.
Finalmente, muitos de vocês perguntaram: por que não deixar isso por conta de outros países ou buscar soluções sem ter que recorrer à força? Conforme muitos me escreveram, “não devemos ser a polícia do mundo”.
Concordo, e tenho uma preferência profundamente enraizada por soluções pacíficas. Nos últimos dois anos, meu governo tentou a diplomacia e sanções, alertas e negociações – mas mesmo assim armas químicas foram usadas pelo regime de Assad.
No entanto, nos últimos dias, temos visto sinais encorajadores. Em parte graças à ameaça crível da ação militar dos EUA, bem como diálogos construtivos que eu tive com o presidente Putin, o governo russo indicou que está disposto a se unir à comunidade internacional para forçar Assad a abrir mão de suas armas químicas. O regime de Assad admitiu agora que possui essas armas, e até disse que eles se uniriam à Convenção de Armas Químicas, que proíbe seu uso.
É cedo demais para saber se essa oferta será bem sucedida, e qualquer acordo deverá verificar que o regime de Assad manterá seus compromissos. Mas essa iniciativa tem o potencial de remover a ameaça das armas químicas sem o uso da força, particularmente porque a Rússia é um dos aliados mais fortes de Assad.
Portanto, eu pedi aos líderes do Congresso que adiem o voto para autorizar o uso da força enquanto recorremos a esse caminho diplomático. Estou enviando o secretário de Estado, John Kerry, para se reunir com seu homólogo russo na quinta-feira, e continuarei minhas próprias discussões com o presidente Putin. Já dialoguei com os líderes de dois dos nossos aliados mais próximos, a França e o Reino Unido, e trabalharemos juntos em colaboração com a Rússia e a China para apresentar uma resolução no Conselho de Segurança da ONU que exija que Assad abra mão de suas armas químicas, e finalmente destruí-las sob controle internacional. Também daremos aos inspetores da ONU a oportunidade de relatar suas constatações sobre o que aconteceu em 21 de agosto. E continuaremos tentando conseguir apoio de aliados da Europa e das Américas – da Ásia ao Oriente Médio – que concordarem com a necessidade de agir.
Enquanto isso, ordenei que nossas forças militares mantenham sua postura atual para manter pressão sobre Assad, e ficar a postos para responder caso a diplomacia falhe. E hoje, agradeço novamente aos nossos militares e seus familiares por sua incrível força e sacrifícios.
Meus concidadãos americanos, há quase sete décadas, os Estados Unidos têm sido a âncora da segurança mundial. Isso significou fazer mais do que forjar acordos internacionais – significou colocá-los em prática. A carga da liderança é sempre pesada, mas o mundo é um lugar melhor porque a suportamos.
Então, aos meus amigos à direita, peço-lhes que conciliem seu compromisso em relação à força militar dos Estados Unidos com a omissão quando a causa é tão simplesmente justa. Aos meus amigos à esquerda, peço-lhes que conciliem sua crença na liberdade e dignidade para todas as pessoas com essas imagens de crianças se contorcendo de dor, e imóveis no chão frio de um hospital. Pois às vezes resoluções e declarações de condenação simplesmente não são suficientes.
De fato, eu pediria a cada membro do Congresso, e aos telespectadores assistindo de casa esta noite, que vejam os vídeos do ataque e depois se perguntem: em que tipo de mundo nós viveremos se os Estados Unidos da América virem um ditador violar descaradamente a lei internacional com gás venenoso e optarmos por fazer vista grossa?
Franklin Roosevelt disse uma vez: “Nossa determinação nacional de nos manter livres de guerras estrangeiras e complicações no exterior não pode nos impedir de sentir uma profunda preocupação quando ideais e princípios estimados por nós são desafiados.” Nossos ideais e princípios, bem como nossa segurança nacional, estão em risco na Síria, juntamente com nossa liderança em um mundo onde procuramos assegurar que as piores armas nunca sejam usadas.
Os Estados Unidos não são a polícia do mundo. Coisas terríveis acontecem em todo o mundo, e corrigir tudo o que há de errado está além da nossa capacidade. Porém, quando podemos evitar, com modesto esforço e risco, que crianças morram asfixiadas por gás, e portanto garantir a segurança das crianças no longo prazo, creio que devemos agir. Isso é o que torna os Estados Unidos diferentes. Isso é o que nos torna excepcionais. Com humildade, mas com determinação, não vamos perder de vista essa verdade essencial.
Obrigado. Que Deus os abençoe. E que Deus abençoe os Estados Unidos da América.
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