Marcha Nacional pela Reforma Agrária sai de Goiânia no dia 1° de maio e chega à Brasília no dia 17, devendo reunir cerca de 12 mil pessoas de todos os estados do país. Lideranças do MST participarão de cerca de 30 audiências em ministérios para debater políticas de desenvolvimento.
Cerca de 12 mil pessoas de todo o país devem percorrer, durante duas semanas, os 200 quilômetros da BR 060, que liga Goiânia à Brasília, na Marcha Nacional pela Reforma Agrária organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e demais entidades ligadas à Via Campesina.
Oito anos após a primeira marcha nacional do movimento (em abril de 1997), que partiu de três pontos diferentes do país e o atravessou a pé, por dois meses, rumo à capital, esta deve ser uma das mais importantes ações políticas do MST. A extensa pauta de exigências, que deve ser entregue ao presidente Lula no dia 17, apresenta demandas não apenas ligadas diretamente à distribuição de terras e estruturação dos assentamentos - como o cumprimento das metas do Plano Nacional de Reforma Agrária (430 mil famílias assentadas), a implementação de um programa de instalação de agroindústrias nos assentamentos e um novo crédito especial para reforma agrária -, mas também bate forte na política econômica e envereda em questões tão distintas como a regulamentação do Plebiscito Popular (Projeto de Lei apresentado pela OAB), democratização dos meios de comunicação, a condenação do governo americano por violações dos direitos humanos no Iraque e a imediata retirada das tropas brasileiras do Haiti.
Segundo o coordenador do MST de Goiânia, Nei Orzekovski, o processo de elaboração das pautas que devem ser apresentadas ao governo perpassou discussões intensas em todos os estados, e contou com apoio e participação de especialistas e intelectuais.
“Tudo foi discutido nas bases antes de chegarmos ao documento final. Por outro lado, as questões relativas à política econômica, por exemplo (como a demanda de diminuição da taxa Selic dos atuais 19,25% para 2,5% ao ano, mesmo nível praticado, segundo o MST, nos Estados Unidos e em países como Venezuela e Argentina), são resultantes de um grande seminário que contou com a presença de economistas renomados”, respondeu Orzekovski à pergunta sobre a viabilidade real da agenda do movimento.
Outros pontos da agenda econômica são: dobrar o valor real do salário mínimo e o valor da aposentadoria para 454 reais mensais, em maio de 2005, e 566 reais em maio de 2006; recuperar o controle governamental e público sobre o Banco Central e sobre a política monetária, e impedir a sua autonomia; não assinar o acordo da ALCA; não aceitar regras da OMC que afetem a economia brasileira; realizar uma Auditoria Pública da dívida externa, como determina a Constituição, e renegociar seu valor.
Durante o período da marcha, antecedendo o ato político da entrega das reivindicações do MST ao presidente, suas lideranças devem participar de uma bateria de 30 audiências com todos os Ministérios mais importantes do governo. Segundo a direção do movimento, as reuniões já estão confirmadas e seus resultados deverão ser divulgados e incluídos no documento final durante o encerramento da marcha.
Caminhando...
Enquanto as articulações políticas se desenrolam em Brasília, na BR 060 um esquema gigante deve permitir um mínimo de conforto para os 12 mil caminhantes. Apoiada pelo governo de Goiás e pelas prefeituras de Goiânia e Anápolis, a infra-estrutura para a marcha contará com 15 caminhões-pipa para fornecimento de água, 33 cozinhas, instaladas no autódromo de Anápolis, para preparo diário do almoço (outros alimentos, como pães e marmitex nos três primeiros dias, virão do governo do estado), 100 banheiros químicos e oito ambulâncias. Já os acampamentos serão montados com as tradicionais lonas pretas.
De acordo com a coordenação da marcha, as caminhadas diárias acontecerão das 5:00 às 10:00 h da manhã, e devem percorrer em média 17 quilômetros. Segundo Orzekovski, “nos outros períodos ocorrerão uma série de atividades de estudo, formação e debates, que deverão discutir temáticas como os pontos do documento que será entregue ao governo; conjuntura nacional; políticas do imperialismo na América Latina; políticas do Agronegócio; água, recursos hídricos e políticas energéticas; transgênicos; Área de Livre Comércio das Américas (ALCA); o desafio das lutas dos trabalhadores do campo e da cidade, entre outros”.
...e cantando
Além dos costumeiros apoios políticos de parlamentares e dirigentes partidários, a Marcha Nacional pela Reforma Agrária também contará com a presença de várias personalidades da classe artística, como os músicos Marcelo Yuka (e sua banda F.U.R.T.O), Lobão, B Negão (ex-Planet Hemp), Zeca Baleiro e Beth Carvalho, os atores Letícia Sabatella, Marcos Winter e Dira Paes (membros da ONG Humanos Direitos), e os cineastas Walter Salles e Eduardo Coutinho, cuja participação em algum momento da marcha já está confirmada. Também foram convidados (mas ainda não confirmaram presença) os cantores Marisa Monte e Samuel Rosa, o cineasta João Salles, entre outros.
“Estaremos promovendo uma série de atividades culturais durante a marcha, entre elas palestras com os artistas, exibições de filmes - o Walter Salles vai apresentar ‘Diários de Motocicleta’ - e teatro. Todos que farão apresentações e shows não cobraram nada, é uma contribuição política com o movimento, que tem uma grande discussão em relação à cultura, em relação à socialização da cultura”, explica Mineirinho, coordenador da Comissão de Cultura do MST no Rio de Janeiro.
O engajamento da classe artística com as demandas sociais é uma bandeira que o músico Marcelo Yuka defende como necessária. “Num país que procura desenvolvimento é impossível ter avanço econômico e social justo sem reforma agrária. Se ela não acontece, qualquer luta neste aspecto tem que ter o apoio da sociedade, e acho que os artistas deveriam ter mais participação neste debate. O artista é, na verdade, um cidadão amplificado, e sua proximidade com os movimentos sociais é mais que necessária. Pessoalmente, sempre abracei esta bandeira, mas foi nos últimos três anos que me aproximei efetivamente do MST”, disse Yuka à Agência Carta Maior.
Para o músico, um dos aspectos mais ricos do MST é seu trabalho nos campos de educação e cultura, infelizmente pouco divulgado. “A cultura e a educação fazem parte da mudança que o MST está propondo para o país. O trabalho do movimento com educação é maravilhoso, mas não tem a menor repercussão na mídia. Espero também poder contribuir nisso, vencer o bloqueio que a mídia impõe a esse trabalho do movimento”. Yuka deve participar com sua banda do encerramento da marcha em Brasília
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