O crescente número de assassinatos no campo e a morosidade na realização da reforma agrária levaram mais de 5 mil camponeses às ruas da capital, Caracas, dia 11. Foi a primeira vez que os trabalhadores rurais saíram em marcha em uma declarada critica à leniência do governo, em especial, do judiciário e do Instituto Nacional de Terras (Inti), órgão responsável por concretizar a democratização das terras no país.
"Vir a Caracas foi a maneira que encontramos para fazer com que, de uma vez por todas, escutem a voz dos campesinos. Estamos com nosso presidente, mas o cerco midiático impede que ele saiba qual é a situação real do campo", afirma Orlando Zambrano, dirigente da Frente Nacional Camponesa Ezequiel Zamora.
Luta comun
O recrudescimento da violência por parte dos latifundiários e a burocracia inerente ao aparelho de Estado venezuelano tem freado o avanço da reforma agrária e, por conseqüência, aumentado a insatisfação no campo. Apesar de o presidente Hugo Chávez reiterar, a cada discurso público, a importância de eliminar o latifúndio, sua administração não tem respondido à altura dos anseios dos trabalhadores rurais.
Enquanto acenava para os moradores dos edifícios que cercavam o trajeto de seis quilômetros, Anderson Mathias comentava a importância de conscientizar também os moradores da cidade. "Essa luta não é só dos camponeses. Garantir a soberania alimentar, dar o que comer para o nosso povo, é problema de todos". Eliminar o latifúndio, além de atender à justiça social que se pretende conquistar com a revolução bolivariana, significará instrumentalizar o campo para ser umas das fontes de geração de riquezas do país.
Desde 1922, com a descoberta dos poços de petróleo, a Venezuela abandonou a agricultura e os camponeses foram despejados nas cidades, nos bolsões de miséria, semelhante ao êxodo brasileiro. A realidade, hoje, se vê no prato e nas ruas. Mais de 70% dos alimentos são importados e 16% da população está desempregada. Dos que têm ocupação, 51% são trabalhadores informais.
Contra-revolução
A impunidade aos casos de assassinato e atentados contra os trabalhadores rurais foi um dos grandes temas tratados pela marcha. Braulio Alvarez, um dos principais líderes camponeses, caminhou parte do percurso de muletas. Dia 23 de junho, ele sofreu um atentado à bala no Estado Yaracuy.
Junto com os demais camponeses que reivindicavam justiça para as mortes de seus companheiros, Alvarez entregou ao Ministério Público uma lista de denúncias de casos ainda sem julgamento e de trabalhadores rurais ameaçados de morte.
Para o ministro de Agricultura e Terras, Antonio Albarran, o assassinato de camponeses pelos latifundiários vai além do enfrentamento interno entre os setores da burguesia venezuelana. "Trata-se de um projeto do império para impedir o avanço da revolução. Não vamos permitir nenhum retrocesso", garante.
Investigação
Os camponeses ocuparam a Assembléia Nacional para exigir a criação de uma comissão para investigar os assassinatos e criar condições para aumentar a segurança no campo. Em seguida, se reuniram com o vice-presidente, Jose Vicente Rangel e o ministro de Agricultura e Terras. Um encontro frutífero.
Albarran assegurou a participação dos camponeses na eleição, por assembléia popular, dos dirigentes regionais do Inti. "A partir de agora, esse órgão será dos camponetonio ses. Vamos chegar até as últimas conseqüências, custe o que custar", garantiu o ministro. Além disso, serão nomeados mais 39 fiscais para avaliar os casos de sicariato e os camponeses também participarão da comissão de investigação dos crimes no campo.
Fronteira
Outra questão que preocupa tanto o Estado como os camponeses é a gigante fronteira com a vizinha Colômbia. Segundo relato dos agricultores, por ser uma região de alta tensão, onde estão presentes grupos paramilitares e da guerrilha, as forças de segurança do Estado cerceiam o direito de liberdade ao qualificá-los como "subversivos".
O Estado, por sua vez, tenta impedir a infiltração de agentes irregulares na região. "A única subversão que temos cometido até agora é lutar pelo direito de plantar e colher nossos alimentos", diz Freddy Montilla, agricultor do Estado Barinas.
A manifestação se estendeu até a madrugada da terça-feira. Durante a noite, os camponeses fizeram uma vigília em frente à Assembléia Nacional, em memória dos 140 camponeses assassinados, vítimas do sicariato. Desde que Chávez declarou guerra ao latifúndio, em janeiro, a cada semana, em média, um camponês é assassinado.
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