“Há um ano, o que estava em jogo era a vida”. A percepção do trabalhador informal Juan Luis Crespo ao relembrar o histórico 15 de agosto de 2004 é a mesma de milhões de venezuelanos que decidiram dizer “Não”. A negativa significou a manutenção do governo de Hugo Chávez, eleito em 1998. Nas urnas, por meio de um referendo, 60% da população venezuelana decidiu apoiar a continuidade do processo batizado de revolução bolivariana.

Estavam em disputa dois projetos políticos. De um lado, o do governo Chávez, essencialmente popular, promotor de mudanças na estrutura social por meio de programas governamentais, financiados pelos recursos petroleiro. De outro, os de grupos de oposição financiados por Washington, interessados em voltar a controlar o petróleo e manter os privilégios dos pequenos grupos da burguesia do país que durante décadas absorveram para si os recursos da indústria petrolífera.

Transformação

Para a maioria da população venezuelana, os pobres, a revolução bolivariana trouxe mudanças radicais em suas condições de vida. “A mais importante foi a tomada de consciência. Aprendemos que nós somos responsáveis pelas mudanças. Hoje sabemos do que somos capazes”, comenta a secretária Antonia Alvarado.

Ela admite que problemas sociais históricos como a pobreza ainda não foram resolvidos, mas considera que a população tem, hoje, consciência de que é preciso trabalhar junto às instituições para mudar essa situação. Trata-se de colocar em prática o conceito de democracia participativa ou o que diz a própria Constituição bolivariana. “O artigo 62 assegura a participação do povo para definir os rumos do país”, comenta, o trabalhador informal Crespo.

Um consenso na Venezuela, no entanto, é que a burocracia se tornou a principal barreira do avanço do governo. Outra dificuldade é a corrupção. “Sabemos que a maioria não cumpre com as ordens do presidente. Por isso, cabe a nós fazer a controladoria social”, afirma Antonia.

Repercussões

O “Não” do 15 de agosto foi importante não apenas para venezuelanos como Antônia e Juan. Estava em jogo também o novo cenário político latino-americano. A vitória de Chávez favoreceu o fortalecimento dos movimentos de resistência que se levantam nos países vizinhos. Mais do que financiar grupos “rebeldes” como acusam os Estados Unidos, Chávez mostra com o seu governo que há uma alternativa ao capitalismo e que a soberania dos povos deve estar acima dos interesses de Washington.

E apesar das tentativas de desestabilização financiadas pelos Estados Unidos, o efeito tem sido contrário. Depois de seis anos de Chávez no poder, segundo a pesquisa Datanalisis do mês de agosto, mais de 70% dos venezuelanos apóiam o governo. Nas eleições de 7 de agosto, quase 70% dos integrantes das juntas municipais e conselhos políticos são de partidos que apóiam o presidente.

Avaliando o aniversário do triunfo no referendo, Chávez afirma que a Venezuela segue em um processo de “transição apontando para um póscapitalismo, que pode ser chamado de pré-socialismo”. “Algo está morrendo, mas não terminou de morrer e algo está nascendo, e não terminou de nascer”, avalia.