Índices divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, indicando um aumento de 6,2% no desmatamento na Amazônia, entre 2003 e 2004, provoca reação de entidades ambientalistas. "Acendeu a luz amarela", diz secretário-geral do Grupo de Trabalho Amazônico.
Ao relutar em anunciar os dados relativos ao desmatamento da Amazônia entre agosto de 2003 e agosto de 2004, levantados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a área ambiental do governo federal parecia estar adivinhando que eles só serviriam para deteriorar sua relação com o movimento ambientalista.
Anunciado na noite de quarta-feira (18), o aumento de 6,2% no índice de desmatamento em relação ao período anterior - totalizando 26.130 quilômetros quadrados, o segundo maior índice já registrado - fortaleceu nos movimentos sociais a impressão de que as realizações ambientais do governo Lula são meramente virtuais, existindo apenas na papelada dos projetos e na boa vontade da equipe que compõe o Ministério do Meio Ambiente.
A divulgação dos índices de desmatamento já causou até mesmo um pequeno cismo político, com o anúncio feito nesta quinta-feira (19) pela bancada do PV na Câmara de que o partido está deixando a base de apoio do governo Lula.
Secretário-geral do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA) e membro da coordenação do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais pelo Meio Ambiente e o Desenvolvimento (FBOMS), Adilson Vieira afirma que os índices divulgados deixaram os ambientalistas “super decepcionados” com o governo Lula: “Acendeu a luz amarela. Como é que pode um governo que cria planos de desenvolvimento sustentável para a Amazônia, para a BR-163 e tantos outros deixar tanto a desejar na luta real? Deter o desmatamento nessa velocidade não é solução. Nem a estagnação dos índices, nesse patamar alarmante e absurdo, interessa aos povos da Amazônia. Não podemos estar satisfeitos com esse governo na forma em que as coisas estão”, disse.
Para o coordenador de projetos do Greenpeace na Amazônia, Paulo Adário, a persistência dos índices de desmatamento em patamares elevados mesmo depois da entrada em vigor do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento é reflexo da ausência do governo federal: “Esse plano reúne 13 ministérios sob o comando da Casa Civil e entrou em vigor em março do ano passado.
No entanto, ele está patinando e não tem resultados efetivos até hoje, como os números podem comprovar”. Adário ressalta a contradição no seio do governo Lula: “Na prática, dentro do governo falta apoio para defender os recursos florestais e sobra apoio para o agronegócio que patrocina atividades destruidoras da floresta como a pecuária e a monocultura da soja”, afirma o ambientalista.
Ladeada pelos ministros Ciro Gomes (Integração Nacional) e Eduardo Campos (Ciência e Tecnologia) no salão oval do Palácio do Planalto, onde foram anunciados os índices do desmatamento, a ministra Marina Silva (Meio Ambiente) qualificou os números de “indesejáveis”, mas voltou a afirmar sua confiança no trabalho desenvolvido pelo MMA: “Os números são de fato muito elevados, mas é preciso se levar em conta que os esforços que estão sendo feitos pelo governo para deter o desmatamento, e que se intensificaram a partir de 2004, ainda não foram percebidos pelo levantamento do Inpe”, disse. Marina também se referiu ao crescimento econômico do país para justificar os números: “Não podemos esquecer que o Brasil cresceu 5% e que o aumento no desmatamento registrado em anos anteriores, onde sequer houve crescimento econômico, já superou os 20%”, disse.
“Papo furado”
As argumentações da ministra, no entanto, parecem não ter efeitos muito positivos sobre os ambientalistas: “Nesse ritmo de desmatamento, até os esforços do governo serem percebidos pelo Inpe a floresta já acabou. Aí o governo pode ficar tranqüilo, pois não será mais preciso esquentar a cabeça com plano de desenvolvimento sustentável para a Amazônia”, afirma Adilson Vieira.
Sobre a promessa de Marina de intensificar as ações de combate ao desmatamento, o dirigente do GTA responde dizendo querer menos retórica e mais recursos financeiros: “Isso é papo furado. Na prática, o que vem acontecendo é muito diferente. Os projetos do MMA são muito bons, mas depois têm seus recursos e verbas contingenciados e as ações não são implementadas na prática”, disse.
Paulo Adário também parece acreditar que os rumos do governo Lula em relação à floresta amazônica já estão traçados pela falta de apoio financeiro: “O que se viu foi uma ausência real de prioridade do governo como um todo para com a proteção da Amazônia, refletida na falta de recursos suficientes e na lentidão do desembolso”, afirmou em nota divulgada pelo Greenpeace.
Além do contingenciamento, a demora na aplicação dos recursos também é citada pela ONG: “Dos R$ 82 milhões que seriam destinados ao Ibama para coibir atividades predatórias na Amazônia em 2004, R$ 40 milhões chegaram ao órgão em agosto e R$ 20 milhões dois dias antes do final do ano. E, mesmo assim, só R$ 9 milhões foram para a fiscalização. Enquanto isso, o Ibama enfrentou duas greves e mantém até hoje um quadro de funcionários insuficiente para cumprir sua missão”, afirma a nota do Greenpeace.
Aumento de apreensão
Apesar da contrariedade manifestada pelo movimento ambientalista, o MMA divulgou dados que demonstram a ação do governo. Em 2003, segundo o ministério, houve um incremento de 68% na realização de grandes operações de fiscalização e um aumento de 54% no total de infrações registradas pelo Ibama. No ano passado, quando começaram as operações integradas do MMA com os ministérios do Trabalho e do Exército e com as polícias Federal e Rodoviária Federal, as infrações registradas pelo Ibama aumentaram 83%, com a apreensão de 73 mil metros cúbicos de madeira extraída ilegalmente. Até abril deste ano, segundo o MMA, o Ibama já havia apreendido 52 mil metros cúbicos de madeira ilegal.
Outro dado que o governo procura trabalhar de forma positiva é fato de seis estados, entre os oito analisados pelo Inpe, terem diminuído seu ritmo de desmatamento. São eles Tocantins (-44%), Amazonas (-39%), Maranhão (-26%), Acre (-185) e Pará (-2%), com destaque para Roraima, que apresentou índice zero. Em compensação, os dois estados que aumentaram seu índice, Rondônia (+23%) e Mato Grosso (+20%), o fizeram de forma devastadora: “A diminuição dos índices é boa, mas em alguns casos, como no Pará, é ínfima. Por outro lado, o aumento em Rondônia e Mato Grosso é alarmante”, alerta Vieira.
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